segunda-feira, 23 de junho de 2014

Aeroporto de Barcelona - uma aventura quase tecnológica

Tenho tempo. Finalmente consegui sentar-me perto (?) das portas de embarque sem ser obrigada a consumir um café e um croissant por sete ou oito euros. Aéreos, é caso para dizê-lo. Ah, sentar-me. Até porque trago comida no saco, detesto deitar comida fora e já deixei parte do nosso espólio de emergência no café do pequeno-almoço e o resto trago comigo aqui: pão, queijo e iogurtes. É verdade, no Aeroporto de Atenas apreenderam-me dois iogurtes gregos sólidos de quilo porque supostamente eram líquidos e aqui deixaram-me passar com bué de iogurtes normais porque a capacidade está em gramas. Coisas. Todas estas incongruências: poder trazer ou não determinados objectos ou substâncias na bagagem de mão; não poder transportar algumas delas para a zona de embarque mas logo a seguir poder adquirir outras iguais ou piores na Duty Free; o facto de as regras ou a sua aplicação mudarem de país para país e até mesmo de aeroporto para aeroporto (que diferença entre este de Barcelona e o de Madrid!), tudo isto somado só serve para percebermos de forma ainda mais inequívoca - como se fosse necessário! - o carácter arbitrário e gratuito da maior parte das medidas ditas de segurança. Porque - vamos lá combinar - se eu quisesse mesmo provocar estragos durante o voo por que raios haveria de o fazer utilizando uma terrina de iogurte grego, por mais que a dita seja de terracota? Para isso usava o tablet ou um livro de capa dura - trago ambos na bagagem de mão. Garanto que a pancada na cabeça dos tripulantes não resultaria mais fracota. Com a vantagem de ser um trabalho muito mais limpo. E que posso eu fazer com uma garrafa de 25 cl de líquido que não possa com algum dos objectos que trago comigo? Já se imaginaram estrafegados com o cordão azul de um tampão OB? Ah, pois é. Os que trago na mala chegariam para a tripulação inteira e ainda para um ou outro passageiro mais recalcitrante... E os pins, canetas, pinças e outras armas igualmente letais que trago aqui comigo? Se resolvesse usá-las de forma, digamos, menos ortodoxa não fariam muito mais estragos que os provocados por um ou mesmo dois iogurtes gregos? Ora digam lá: o que dói mais? levar com uma terrina de barro na carola ou ser lentamente torturado com o auxílio de pinças, canetas, lápis e até um ou outro alfinete de pin?
Ah, sentar-me. Consumir algum do peso que trago no saco e que o levou a romper-se ainda agora em plena passagem para a zona de embarque. Um americano - ou coisa que o valha- providencial salvou-me com um saco de papel mais resistente que o meu.
OK, sentar-me. De preferência longe da poluição publicitária. E olfactiva. Há perfumes que me são insuportáveis, não é não gostar do cheiro, é literalmente não os suportar, sentir-me mal, a sufocar, ter ataques de tosse, os olhos a arder, chorar copiosamente et j'en passe.
Mas aqui neste cantinho estou relativamente resguardada da confusão sem perder de vista a minha porta onde ainda se processa o embarque anterior e preparo-me para finalmente ligar-me à net. Aeroporto, free zone, certo? Errado. Quer dizer, supostamente tenho direito a 15 minutos grátis, o que me dava imenso jeito, mas constato que tenho de preencher todo um formulário com dados pessoais. O que me chateia. Não vou fazê-lo. Ou então vou dar dados fictícios. Hum, melhor não. Ainda dá merda. Ok. Vou preencher com os meus dados. Afinal, não tenho nada a esconder. Sou uma cidadã honesta que quer consultar o seu mail e actualizar o seu facebook num aeroporto internacional, não estou a prevaricar. Só quero aceder à rede. E se possível sem esta sensação de que estou a ser observada. Sim, eu sei. O meu telefone está provavelmente sob escuta, o meu fb, o meu gmail e outras contas tivesse são diariamente esquadrinhados em busca de algo que me possa incriminar, mas no dia-a-dia esqueço-me, ou melhor, a maior parte do tempo não penso nisso enquanto que aqui, neste local, neste não-lugar o peso do "policial" e do "securitário" faz-se sentir em toda a sua amplitude. No aeroporto quando vais passar o conteúdo das bagagens na maquineta do raio X, ainda que não tenhas contigo rigorosamente nada que te possa causar problemas há sempre aquele peso no ar, aquele bichinho murphyano que te sussurra ao ouvido: "vais ser apanhada, alguém te pôs uma granada E um kilo de coca no saco enquanto estavas distraída a olhar para o painel de informações e é por isso, aliás, que ele agora está tão pesado". E por falar nisso, aquele americano ou coisa que o valha...
Mas a tentação de me ligar à net é muito forte. Que importa, afinal? Não tenho nada a esconder. Vou pôr os meus próprios dados e pronto, quero lá saber. E vou lá e preencho aquela merda. Nome, email (uma conta desactivada, claro, que não quero passar os próximos anos a receber informações do Aeroporto de Barcelona), sexo, idade, país, código postal (aqui também me permito improvisar um bocadinho...), aceito as condições e... então, e agora, o que é que falta? Indique o seu sexo, diz a janelinha. Indico. (Enquanto vou pensando que aquelas duas opções suscitariam acesa discussão em certos meios) Por favor indique o seu sexo, insiste a janelinha. Bolas, já indiquei. Feminino. Qual é a dúvida? Não cliquei? Clico. (Já tinha clicado). Por favor indique o seu sexo. Porra, vão bugiar. Não me conecto mas apago tudo. Nome, idade, email desactivado e código postal da tanga. Sim, eu sei, não serve de nada mas ao menos fez-me pegar na caneta e no papel.